Por Gisele Rodrigues (*)
Os princípios da lisura, isonomia e transparência foram ignorados pela Fundação Getulio Vargas nas provas do concurso público para o Senado Federal aplicadas no último dia 11. De trás pra frente, vamos aos fatos. O que dizer de uma organizadora que expira o prazo para recursos contra o gabarito oficial sem publicar as questões das provas? Como o candidato poderia questionar a adequação das respostas sem o caderno de provas em mãos? Como a sociedade pode saber o que foi cobrado dos candidatos a salários de R$ 23,8 mil? O que achar de um gabarito oficial que já é divulgado com anulações?
Foram mais de R$ 30 milhões arrecadados nas taxas de inscrição de quase 158 mil candidatos. Será que não sobrou dinheiro para remunerar as bancas a ponto de ser preciso reproduzir questões de concursos anteriores? Há uma prova em que mais de 30 questões foram clonadas de outra aplicada anos atrás. Quantos candidatos se beneficiaram do fato?
Os conteúdos das provas foram risíveis: questões iguais para candidatos de nível médio e de nível superior; questões repetidas em áreas de conhecimento completamente distintas; incontáveis erros de digitação e ortografia; e, por fim, o mais chocante: questões de “atualidades” absolutamente impertinentes.
Uma banca examinadora que se propõe a medir o conhecimento do candidato sobre políticas públicas, meio ambiente, economia e processo legislativo simplesmente não tem o direito de abordar frivolidades, especialmente quando estas não estão previstas em edital. É no mínimo estranho esperar de um candidato ao cargo de consultor legislativo (dono do salário acima) que ele saiba sobre as confidências da suposta amante do presidente Kennedy, de nome “Mimi”, e suas incursões ao leito da primeira dama americana.
Também não é inteligente cobrar, entre as tais questões de “atualidades”, o conhecimento do nome da empresa fabricante de monorails para a cidade de São Paulo e os nomes de dois novos diretores da Petrobras, com as respectivas diretorias. São memorizações imponderáveis. São questões que obrigam o candidato a “chutar” e que dele não aferem qualquer capacidade de formular juízo crítico.
Quem passou os últimos dias lendo sobre déficit público, BRICS, Lei da Ficha Limpa, Lei de Acesso à Informação, Código Florestal, Comissão da Verdade e outros temas que têm estampado os jornais saiu da prova com a sensação de não ter lido suficientemente as revistas do cabeleireiro. Ficou com a certeza de ter sido aviltado.
Os tiros no pé dados pela organizadora do concurso já começaram a aparecer. Faltaram provas, trocaram-se provas e o resultado foi a anulação do certame em várias áreas e o desrespeito com mais de dez mil candidatos que terão de fazer tudo de novo. Mas o Poder da República dono dos salários mais gordos do funcionalismo público deve exigir mais.
Não pode aceitar que a escolha de seus novos servidores seja feita de maneira tão amadora, desregrada e desqualificada. A anulação completa do concurso demonstra ser o único caminho possível.
* Gisele Rodrigues é jornalista e professora

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